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Running VS Science

Um blog científico cheio de curiosidades sobre a corrida, conselhos para melhorar a performance e entrevistas fenomenais a casos reais de pessoas comuns que venceram na corrida.

12 de Dezembro, 2017

O desempenho desportivo africano

Nádia Santos

 

corredores-quenianos.jpg

 

 

 

 

Não é segredo nenhum que nos dias de hoje, os pódios de competições internacionais, especialmente de longas distâncias como a maratona, são dominados por atletas de origem africana, principalmente do Quénia e da Etiópia. Este domínio, por sua vez, levanta questões acerca do excelente desempenho desportivo destes atletas por parte de atletas europeus, que em tempos já dominaram estas provas.

Antes de falarmos das possíveis vantagens dos corredores africanos, necessitamos primeiro de compreender que o desempenho desportivo advém de diversos fatores que podem ser externos ou internos. Fatores como o ambiente, a alimentação, a motivação, etc. fazem parte dos fatores externos, enquanto que a genética e a idade, farão parte dos fatores internos.

A biologia já se encontra bastante ciente de que as nossas características advêm não apenas da informação que os nossos genes (transmitidos à descendência pelos nossos pais) nos oferecem, mas também do meio ambiente em que nos encontramos e como estes dois se relacionam um com outro. Para vos exemplificar, podemos dar o exemplo de dois gémeos verdadeiros, cujo genoma à nascença é igual, mas um pode-se tornar um génio da matemática em comparação ao outro, apenas pelo facto de ao longo do seu crescimento ter tido mais contacto com problemas lógicos e matemáticos. No desempenho desportivo, iremos então ver que a lógica se mantém.

 

FATORES EXTERNOS

 

Comecemos então por falar nos fatores externos. Vários atletas de elite africanos, já referiram que pelo facto de terem vivido em pequenas vilas longe das cidades, que o seu meio de transporte para a escola era nada mais, nada menos, do que a própria locomoção. Isto é, desde crianças que estes atletas são obrigados a recorrer à corrida e à caminhada para se deslocarem, muitas das vezes por imensos quilómetros fora. Este é sem dúvida um fator muito importante, já que é de conhecimento comum que “de pequenino se torce o pepino”.

Outro fator externo muito importante é o facto de tanto a Etiópia como o Quénia, se encontrarem a cerca de 2000-2500m de altitude em relação ao mar. A questão da altitude e sua função no seu desempenho já é altamente discutida pela ciência e nomeadamente utilizada como estratégia. Podem ler um pouco mais sobre como a altitude afeta positivamente o desempenho aqui: Correr em altas altitudes .

Obviamente, também não nos podemos esquecer da componente alimentar. Estes atletas, desde muito cedo, que possuem uma alimentação rica em carbohidratos e pobre em gorduras saturadas. Como sabemos, os carbohidratos são essenciais para fornecimento de energia.

Por último, mas não menos importante, temos a questão da motivação. Todos sabemos que motivados vamos mais longe, mas de facto estes atletas, devido às pobres condições económicas, são altamente motivados ao desporto de forma também a conseguirem uma vida melhor, já que o desemprego é bastante elevado.

Portanto, já falamos de diversos fatores externos que poderão estar associados ao grande desempenho destes atletas. Outros tantos, tal como o treino intensivo e dedicado (aconselhe-vos a verem no youtube alguns vídeos de treinos destes atletas), também terão a sua grande importância. No entanto, está na hora de falarmos um bocadinho sobre os possíveis fatores internos e entrar então com um pouco de ciência pelo meio.

 

FATORES INTERNOS 

 

Comecemos por falar de fatores fisiológicos e bioquímicos. Já tínhamos falado anteriormente no blog do significado e importância do VO2 máx. Uma das questões levantadas, era se estes atletas poderiam possuir um valor mais elevado deste indicador. No entanto, estudos relevaram que a diferença entre estes atletas e atletas americanos e/ou europeus não era significativa. Isto é, todos eles (referindo-nos a atletas de elite) possuem um VO2 máx de aproximadamente 79/80 ml/kg/min (um ligeira piada, o meu é 48 :p).

Estes resultados, levaram a pensar: “Mas então, se o VO2 máx é idêntico, como é que estes atletas conseguem mais facilmente atingir o resultado de 62m à meia maratona?” ou “Mas então, porque conseguem em média, correr os 10 km dois minutos abaixo dos restantes atletas?”. A resposta poderá partir na questão do limiar do lactato. O atleta até pode ter um VO2 máx bastante elevado mas não conseguir atingir % tão próximas do mesmo, graças ao facto de acumular mais lactato nos músculos (responsável pelo cansaço). Estes atletas, por sua vez, conseguem usar maior percentagem de taxa de oxigénio, precisamente porque o seu limiar do lactato é mais alto (concentram menos). Por outro lado, não se esqueçam que estes atletas, treinam nas tais altitudes.

Mas que fenómeno bioquímico poderá estar por detrás desta menor acumulação de lactato? Bem, pensou-se que poderia ser pela atividade mitocondrial (o local onde ocorre o nosso metabolismo), isto é, quanto maior esta atividade, menor a acumulação. No entanto, estes atletas, não revelaram diferenças estatisticamente plausíveis.

Por último, porque não podemos passar aqui o dia a explicar possíveis indicadores para tornar estes atletas TÃO BONS, falaremos da questão da biofísica e fisionomia destes atletas. É de conhecimento geral, que estes possuem membros magros e longos, que lhes permitem um menor custo metabólico. Aliás, sabe-se que os quenianos possuem o chamado típico somatotipo ectomórfico (ver figura 1) que pode permitir uma melhor eficiência biomecânica e metabólica.

 

biotipo.jpg(Figura 1) 

 

O desempenho desportivo destes atletas, como podemos ver, deve-se a diversos fatores. Muitos eles, ainda em necessidade de estudos mais conclusivos. Quanto a vocês, espero que vos tenha deixado o “bichinho” de pesquisarem um pouco mais sobre o tema aqui discutido. Até lá, vamos treinando … Não se esqueçam, os fatores externos são de extrema importância!

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